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Trago Flores no cesto - coração - Orvalhadas e gratas. Trago versos - frutos - Cato palavras que caibam No meu coração que Ama ...

.. obrigada .. :)

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Febre

Cruzam-se os ponteiros do relógio
E ora é noite que perpassa o dia...
Sem nem sequer dar um bom dia.
E as minhas pernas cruzam-se e quase pensam.
Cruzam-se fronteiras e antevejo o abismo.

E esta febre que não passa.

Dedos por entre os meus cabelos
Embaraçados e ainda os pensamentos.
Cruzam-se pessoas nas ruas em passos apressados
E o Outono acaba de cruzar com o Inverno.
Folhas molhadas enfeitam-se ao assobio do vento

E esta febre que não passa.

Carros e pessoas avançam os sinais.
Sinais ignoram a razão.
Sinais.

E esta febre que não passa.

Estúpidos ponteiros do relógio.
Vida estática na parede da quase morta:
Escuto uma febre insolente... que pulsa.

Karla Mello

OST: Alyssa Monks

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Flor da Amizade

Com palavras precisas
Semeou bravura
- Chão meu sem forças -
Sem perder de vista
A humilde ternura.

Necessárias são
As palavras "duras" - pão
E alimentou-me o irmão
E regou o meu sem chão.

E foi toda a candura
E a semente regou
Terra seca da quase louca
Girando em si mesma
Com a fé gasta e pouca.

Brotou do medo
Frágil botão
Nas terras de outrora
Áridas
Do meu coração.

Linda é a Flor da Amizade.
Poucos a têm.
Esta não possui endereço
É ausência de espaço
E tempo ...
É  etérea ... É eterna
É gentileza e bondade.

.... um dia também chamar-se-á Saudade.

Karla Mello

OST: Omar Ortiz - "Salto de Fé"


quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Orfandade


Então me abraces
E o encontro dos nossos
Medos
Flutuará sem chão,
Sem teto,
Sem mãe.
Nós...
Os dois:
Numa orfandade faminta
De vida.
Quase incólumes.
Apenas e só
No instante do abraço.

Andamos mesmo,
Ultimamente,
A marcar desencontros
Com as palavras.
E estes desencontros
Consistem numa certa
Delicadeza infinita
Que testemunha
O céu azul das nossas
Bocas em silêncio.

Karla Mello

OST: Philipp Weber

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Poeme-se

Poeme-se!
Desajuste-se
Do mundo!
Não caiba!
Só na camiseta.
Não cale-se!
Não guarde-se!
Use-se!
Inteira!
Nunca morna!
Nos vértices
Da alma
Levite-se!
Desarme-se!
Ame-se!
Ame muito!
Ame tudo!
Ame a todos!
Arme-se...
Com flores
Nos cabelos!
Nas palavras!
Nas atitudes!
Abrace!
Solte-se!
Pense!
Espalhe-se
Em rimas!
Sem rimas!
Supere-se!
Sê livre!
Transforme-se
Em armas do céu!
Em armas de versos!
Poeme-se!

Karla Mello

Fotografia: arquivo pessoal

Verdades e Alegorias


Eu não acredito mais em ti.
Nesta tua roupa engomadinha
E quase perto do “perfeitinho”.
Preferia eu aquela roupa
Que vestias tu
quando encontraste-me.

E estavas tu
todo amarrotado e eu.
Desbotados
Desprovidos de conceitos
Sobre tudo e sobre nós.

E estavas tu
Incandescente!
Do Amor de todas as mãos dadas.
E estavas tu
tão cansado
do homem "ser" e ainda eu.

E vestias tu
todas as verdades tuas
E eu ainda todas as minhas.
E mesmo amarrotadas
Eram amarrotadas verdades nossas.

Amei todas as tuas
amarrotadas vestes da verdade
que combinavam com as minhas
verdades e alegorias.

Karla Mello - "Verdades e Alegorias"

OST: Marcio C

Horizonte Meu

sêlo em meu rosto
de mãe
o beijinho teu
e coloridos ficam 
os dias meus.
foi que emoldurei
tu:
horizonte meu
na parede minha.
e tracei 
horizontes de Amores
dos beijinhos teus.

Karla Mello - "Horizonte Meu"

Fotografia: arquivo pessoal

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Da Complexidade do EU


tento racionalizar
o lufar da porta entreaberta.
grão de areia partido em pedaços:
fragmentados pensativos eu's.

breve o eu
compacto.
suprimido e complexo
como o instante da morte.
como o sopro da Vida.
qualquer coisa contemplativa
que impulsiona a respiração
como no instante da criação
de toda a Arte:
de eu's compilados...
desarrumados e antagônicos
que ecoam
gritos das paredes
mudas.

... e apenas Ele escuta ...

Karla Mello - "Da Complexidade do EU"

Imagem: Google


Dia de Cão


Criamos as antíteses e refletimos
E fazemos cálculos e caras e bocas
E poses de fotografias
E publicamos ao mundo
Teses sobre as Tuas ternas flores.
Decidimos qual a “frase” do momento
Sentida e creditada por “não sei quem”.
E estamos sempre na Tua contra-mão
Quando deveríamos mesmo ser mudos.
E são tantas as “bandeiras” e “teses”...
Teses sob as Tuas humanas mentes
Doentes! .. Todas doentes!
E não nos esforçamos em quebrar fronteiras
Nossas!
Que nos impedem de Amar os diferentes
De nós.
Nós somos os modelos!
Mas quebramos todas as fronteiras
Dos cobiçados continentes
E matamos mulheres!
Crianças!
Abandonamos os nossos!
E os nossos velhos
Que contam histórias sobre nós.
Conseguimos desculpas para tudo
Paramos tudo
Para que passe a nossa vaidade.
E o "desfile" tem que ser em larga avenida...
Senão, não cabe.

Mundo caos e eu!
E somos “suficientemente bons” em quase tudo.
E eu queria ser insuficiente!
Dessas que não coubessem
Em nenhum padrão de Amar.

Insuficientes somos sem Ti, ó Pai!

Não há um justo sob o Teu indecifrável Céu
Que bordaste Tu com primor por Amor
A nós! Seres indigentes!
E a Lua! Nua! - não necessita pudor.
Ela está para todos os loucos
Que param o seu tempo
Apenas para contemplá-la.

Hoje eu acordei cansada...
De mim.
Não quero a face do espelho.
Dia de cão.

Hoje eu suicidei-me novamente
Em Ti.
Ó luta sem fim!

Karla Mello

OST: Jeremy Mann

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

pOeMiNhA dE sAuDaDe


Saudade é borboleta
Liberta do casulo.
Casulo é a presença.

... Borboleta é a beleza da ausência.

Karla Mello 

OST: Fabiano Millani

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Dança Com A Minha Morte

Nasci de retalhos do amor.
Foram em mim, costurados
Na carne humana e frágil
Dos lares equivocados.

Não gosto de ocupar lugares
Que forcem-me no meu horário
De rir ou chorar ou abraçar
Pois e se visto eu o cansaço
Seria eu, então, um armário
Desses que guardam máscara.
Desses que cheiram à mofo.
Gosto eu de tudo o que escancara.

Não gosto de lugares e títulos
Estragam o meu eu, já tão aflito.
Gosto de ser parceira... companheira.
Parceria nunca pede cativa cadeira.
Não gosto de falar p'ra gente
Gosto de aprender com Gente.
Estou aqui e acolá... não quero sempre estar.
Bom mesmo é deixar a saudade
Perfumar por si mesma, o ar.

Renasci de retalhos da dor
Lacerados num copo de vinho
Lacerados num pedaço de pão.
A fome da carne é um vão!
Farta é a cruz do perdão
Onde ele mostrou-me o Amor:

Face que brilha na noite
Mão que apascenta o açoite
Todos os dias a recomeçar.
- Mato-me todos os dias!
- Rio-me na cara da morte!
… E convido-a para dançar!
- Canto livre em cada golpe!
Morte voluntária de mim
Liberto-me de mim, enfim.

E que eu diminua tanto e tanto
E que eu escandalize o meu EU que olha
E grita diminuto a sua própria morte
- Descrente EU que acredita na sorte!

Miro o morto EU de soslaio...
Liberto-me de mim, enfim.

… Nasci do imutável Amor por mim.

Karla Mello

OST: Brad Kunkle

sábado, 26 de novembro de 2016

Da Bailarina Menina


Ela era uma bailarina
De uma valsa que apenas ela
Ousava, louca, bailar.
E trazia nos seus cabelos
Uma tiara da cor do arco-iris 
E a saia toda bordada
Com estrelas cintilantes de ponta
E ainda a sapatilha
Que calçava apenas um pé.
O outro par ela perdeu por aí...
Enquanto tentava, erguida
Nela mesma equilibrar.

Ela era apenas menina
Que amarrou um barbante gigante:
dos seus pensamentos tontos,
até a Lua que se esconde.
E prendeu no barbante uma tábua
E fez um balanço brincante...
E balançou até vomitar.

… Há quem a tenha visto à balançar
E ainda a bailar na alva Lua minguante
Iguais aos seus sonhos de instantes.

Ela era mais uma passante
Deste mundo caos ofegante
De “redes” e fotos estanques
De sorrisos em fotos congelados
De momentos, por vezes, errantes
Que fazem barulho constante
De mortos-vivos que andam distantes
Pelas ruas à procura de um abraço
Que cabe, de certo, no laço
Do seu braço que cruza no espaço...
Noa ar... À formar um abraço.

Ela era uma bailarina
Sem graça a buscar uma rima.
A dançar sem platéia ou aplauso
No silêncio da noite tão sua...
À balançar na minguante Lua
Sempre à espreitar a rua da noite
Que bem em meio ao açoite
Haja um sentimento par que estanque
O Amor sobre o mundo que dói - sua sina
Bailarina sonhadora menina...

… Ela é qualquer coisa esquisita...
Entre o acreditar nos sonhos e o acordar deles aflita.
Ela prefere prendê-los todos num bonito laço de fita.

Karla Mello


OST: Leonid Afremov

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Da Janela Que Engoliu Um Bosque


Aprendi a conversar com o bosque.
Nos cumprimentamos, cedo, da minha
Janela da alma que sempre está
A orar e a cantar e a dançar!
E a falar sempre sozinha,
E ainda a cozinhar
Pensamentos e comidinhas
Orvalhadas de sonhar.

Aprendi a conversar com os passarinhos.
Nos cumprimentamos, cedo, da minha
Janela do céu de minha boca
Estrelada e que gosta de sorrir.
E ainda de soprar mil beijinhos
Bem para lá do além mar
Repletos de Amor e carinho.
Passarinhos sempre sabem, ao certo,
Quando eu estou a falar de ninho.

Sinto-me sozinha de gente.
Perto - gente que engole gente,
Gente que engole sonho,
Gente que aborta gente
Do coração...
Sem ter noção...
Do que aquece, em Verdade, um coração.
E eu ando, assim, a residir embaixo
Da sola do seu sapato – hiato
Fendas, eu e tu e entre as palavras nossas
O EGO de gente e sua dor é o seu
Mundo cego, mundo mudo, mundo torpe...
No seu solitário e triste vão recato.

Silencio e piso devagar por entre as fendas - hiato.

Aprendi a conversar com o bosque
Nos cumprimentamos, cedo, da minha
Janela ensolarada e fresquinha.
Ele sempre me diz de lá, alegre e verdinho:
- "Caminha firme... Caminha!"
Sempre respondo a sorrir... Levezinho.

Da minha janela que engoliu um bosque.
Na minha janela cabe um vasto
Mundo... Da minha janela.

Karla Mello

OST: Márcio Camargo

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Despetalada Flor-Dilacera

Despetalei a Flor
De onde eu fui
Botão.
E grão.
E não.

Haste sem pétalas
O dedo de tua mão
A ordenar.
E percebo melhor
O que foste tu
O que sou eu
E por onde vou
Seguir.

Lavei com água
Do choro
Daquela criança
Que ainda traz
A Flor trôpega
Com folha escrita
De tua reza
Que se desfaz.

Despetalei a Flor!
Descabelada estou!
Caule despido és!
E miro-te...
E miro-me.
E procuro o Amor
Ambíguo e nosso
Nos vestidinhos meninos
Em viés.

... Cresci! E ganhei olhos de ver!
Dor que dilacera!
Ampara-me!

- Silêncio -

Eu já não visto mais os teus equivocados retalhos.
Prefiro vestir os loucos versos... Remendos meus.
... Há quem diga que eu liberto-me neles.
E de todo o mais...
E das tuas tantas costuras...

Karla Mello

OST: Mike Dargas

terça-feira, 8 de novembro de 2016

TragoVersos

Trago Flores no cesto
- coração -
Orvalhadas e gratas.

Trago versos
- frutos -
Cato palavras que caibam
No meu coração que Ama
O reverso.

Trago abraços
- recebidos -
Desses que abduzem almas doentes
E que gostam de estancar
Choro de gente.

Trago Amor
- endereçado -
Aos passantes que procuram
O par do sapato apertado
Que ninguém quer calçar.

Trago Aquele
- Eu Sou -
O que em todo o tempo É
A todos os que, como eu
Andam cansados de si.

Trago A Paz
- descanso meu -
Daquele que justifica
Daquele que nunca desiste
Daquele que por todos chora...
Daquele que a tudo assiste...
E refaz.

… Enchi o meu cesto com as suas Flores.
Estão todas em oferta àqueles a quem o mundo cospe a face e rejeita.


Karla Mello

OST: Donald Zolan

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Confissão

Eis que aqui estou 
Diante de meu pai 

( Novamente e será sempre
Pois resides tu na minha adoecida mente
- Engavetado! -
Que nem sequer à mim mente
Sobre a tua maldita e minha
Imunda semente )

A confessar-lhe em prantos
Que eu te odeio tanto!
Pois que violaste tu
Todo o meu encanto
Dos meus recantos meninos
Da minha boca em jasmim
Inocente flor de mim
Que era suposto ser
Aquilo que eu nunca fui:
florzinha do teu jardim.

Olho de soslaio
E vejo a tua descarada cara
De morto-vivo tão vivo
E o vômito sobe à minha boca
E sinto-me suja de ti!

... Violaste tu a minha boca menina!

E a minha condenação
É ter-te nas minhas veias
É ter-te na minha mente
E passeares e rires cínico
Nesta  minha dor-solidão.

... Pobre menina indefesa!

Ninguém viu!
Ninguém ouviu!
Mas todos bradam e falam
Do seu caminhar torpe e vil!

… Escandalosa mulher que aos errados ama!

- Mas e o que era certo em teu amor por mim que clama,
para que fosse certo em meu amar que é breve chama?!
E lacera-se a garganta minha
Num grito de socorro antigo:

… Ninguém nunca ouviu!

Mas ainda replica
Mas ainda ressoa
Mas ainda ecoa
Mas ainda escorre
Pelo olhar
De filha consolada nos braços do pai
Este onde ela se sente
Limpa, leve, justificada.
Sua flor menina e amada.

Eu não preciso de ti.
E cuspo a tua cara maldita!
E entrego-te a todos os infernos meus!
A todos os descompassos meus!
A todas as dores minhas!
É tudo teu!
Brindas tu, então!
Nos infernos todos teus!
Do teu viver hébrio e parco.
Anárquico!
Da minha existência opaca...
Desta que, um dia, perdoa-te
E tão somente a ti.

… Confesso e repouso em teus braços, pai.
Amoroso e materno. Imutável e eterno.

Karla Mello

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Do Céu da Boca


E eu queria arrancar a "cara" do meu desejo...
E enfiar a minha "cara" de todos os "nãos" que eu nunca te dei...
Na tua cara!
No meio da nossa cama!
Nas tuas mentiras!
Nos lapsos de amores que me deste!
Restos!
Migalhei-os...
Todos!
Creditei-os...
Louca!
Eu orei por nós...
Estúpida embriaguez de outrora!
Estupida lucidez do agora!

Faz-me rir de mim mesma...
Faz-me chorar por mim, embora...
Sejas tu a minha sina...
Do amanhã... Do outrora...!
E de tanto amar-te... Esqueço-me.
E de tanto esquecer-me,
O tempo impiedoso desce o seu véu
Sobre o tudo quase nada de mim.

E o meu sorriso...?
Ele é um tolo!
Que anda trôpego... Por aí!
Dar-se a cumprimentar a todos!
E rir-se muito... E pouca é a verdade...!

Um sorriso tolo que pensa que é sorriso...
E que pinga gotas solitárias... nos tetos de mim
E nos bastidores do céu estrelado dos sonhos...
Dos desejos e tudo o que descabe...
No vão - céu da minha boca.

Karla Mello

OST: Alyssa Monks

Descom(passos)


Um passo atrás e sinto-me no chão e escorre-me sangue e vida
Sem escolhas e num beco estreito de mim
Sem chão e com segredo sem ouvinte

- "A pior de todas e já condenada ao fogo do inferno!"

E é inverno e faz frio e nada alivia-me da dor que lacera.
Chora a alma e engole o choro e o dolo
e guardo-o a partilhar com Deus.

Dois passos atrás e encontro-me com as minhas criancinhas
Todas atrás de mim a disputarem o meu colo e peito.
E sento-me no chão a ser menino e menina
Posso ser assexuada se com eles estou
Sou versos, rimas e cantigas de ninar
Sou ternura, proteção e coisa que ama,
que vai além de ser humana.

Três passo atrás e vestidinho branco de acácia
e laços vermelhos de fita gourgurão
presos lado a lado são dois... E acho graça
Olhos puxados dos laços apertados
e deve ser por isso que sou livre e quase nunca prendo os cabelos.
Gosto de brincar de crescer e sou tão tola
ainda procuro colo e estou sempre a olhar o medo de soslaio.

Um passo à frente e encontro-me trôpega e sem destino
Entretanto há porto e norte mas o destino... seria pedir muito à mim!
Não importa o destino e importo-me com o agora de mim.
Uno as pernas e alinho o pensamento e só tenho a mim
E resta-me apenas sonhar.
É tarde demais para desistir de crescer.

Karla Mello

OST: Jimmy Law

Da Indiferença


E era amor...
E de tanto amar
Pertinho do céu que é esta dor...
E nem era agosto...
E nem era frio.

Hoje, dor...
E nem é amor
E nem de pertinho é desgosto.
Indiferença, eis a face...!
Deste calafrio.

Karla Mello

OST: António Mendanha

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Versos Imprecisos


Alguém aprume os lemes
Deste meu sonhador olhar.
Barco e abraço
Meus
No desejo das
Profundas águas tuas
Da agonia quase feliz
Que é amar...
Somente por amar.

Alguém norteie a proa
Deste meu coração
Que navega na bruma
Do Inverno que é
Esquecer
A razão e as pernas
E boca são lemes
Que estão sempre a remar
Teimosamente...
Em tua direção.

Ó, meu bom timoneiro!
E esta febre que não passa.
E esta visão turva no novo!
Esta alegria quase pueril
Que a minha aflição
Brinda!
E velho tornar-se-á!
Todo o "novo" sempre finda!

| não existe novidade no amor |

O amor adoece e finda
E fica outra coisa qualquer
- com sorte ao mar -
Boa e grata em seu lugar.

... desculpa-me os versos cansados e imprecisos...

| o amor... é prenúncio do naufrágio |

Karla Mello

OST: Philipp Weber 

Do EU Inconsciente

Esvazia
A tua boca de palavras
E explicações.
Repousa-a
No meu desejo
No meu beijo
No meu peito.

Enlaça
A tua perna na minha
Sem hífen.
Abraça-me
Pela cintura
Pelo tempo sem relógio
E olha-me nos meus olhos
E guarda-me que eu sou tua
Nas reticências humanas
Entre nós.

Despeço-me
De um hífen psiquê já de pé e tênue...
E de malas prontas no cais: EU inconsciente.

- Até nunca mais.

Karla Mello

OST: Pino Daeni

segunda-feira, 11 de julho de 2016

Algo que me valha..


alguma coisa que me valha!
alguma coisa que me lamba a cara!
alguma coisa que me cale a fala!
alguma coisa que me ceda um colo!
alguma coisa que me cuspa a face.

alguma coisa que me dispa a alma!
alguma coisa que me mova!
alguma coisa que me estanque o sangue!
alguma coisa que me impulsione a fala!
alguma coisa que me negue.

alguma coisa que me rasgue o riso!
alguma coisa que me valha!

... do riso que eu não quero dar.
da palavra que eu quero dizer...
do colo que eu preciso.
porque a verdade... é difícil e única.
e ser verdade...
escandaliza os hipócritas.

Karla Melo

OST: Alyssa Monks

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Incômoda Morta


Falo da morta
Justificada
E que já não fala
E que já não move
E que já não faz
Chorar.

Falo da Viva
Justificada
Que trava a garganta,
Os passos,
As palavras,
O abraço,
A luta
De todos os dias
Com a morta:
Insistente
Incoveniente
Incômoda e sem espaço
Mas que dissimula-me
E quer regaço.

Falo da Viva
Que ora e chora
Sem cessar
E ajoelha
No silêncio
Nas noites
Sem horas
E desfaz-se inteira
E sente pulsar-lhe
A Vida.

Galho seco
A "musguear" verdinho
Com água de choro - orvalho.
E com O Beijo da Inocência
... Florescerá .. Florescerá...

Karla Melo

OST: Zolan

sábado, 25 de junho de 2016

Bem Aventurado


não é da terra
nem é do mar
o abraço laço
em palavras
que nos corrige
os passos.

não é da terra
nem é do mar 
porque maculado
estaria o abraço
e contaminado, assim,
não poderia ser
tudo o que vem
d'Aquele que É.

bem aventurado
o coração que ousa
largar-se de si
e chorar e orar
e atento estar
ao laço abraço

e lançar-se ao mar
revolto
de todos os perdidos,
dos loucos fabricados
e ir para o encontro
do consolador
abraço laço.

.. bem aventurado coração... bem aventurado.

Karla Melo
OST: Horace Vernet

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Dolo de Flor


A terna flor
Em vão afina
A sua textura - descompassada dor
Em seu peito em flor
Primaveril e tolo
Sem qualquer dolo
De querer ser toda
a sua flor menina.

O que faço eu
Se esta minha sina
É morrer de amores
E querer ser flores
E todas as dores
Que traz consigo
Este tanto amor...

Beijos em cores
São sara-dores.
Boca tua minha...
Beijo... Beijo...
Nasço e morro em ti.
E de mim
Brotam flores tuas:
sementes Jasmim
Todas carmim.
São dores-flores nuas
Sob o nosso olhar
Repousado enfim.

Karla Melo

Pintura Hiper Realista - Rob Hefferan

Uma Certa Madalena


caçoar
humilhar
derrubar
despir
abandonar
usurpar
violar
apedrejar
sulgar
o pouco mel
da despetalada
flor
dos campos ressecados
dos instantes seus
onde os pés seus
largavam-se e despediam-se
do seu viver parco
e rasgava-se o chão.

lama, alma, lama a minha.

doente e exposta
aos julgamentos alheios
aos escárnios e
já nem inportava-se mais.
cansar é quase desistir
é quase despedir-se
de si por um fio
tênue à escuridão.

luz!
grandiosa é a luz!

levantou-a
abraçou-a
e não havia mais ninguém
à julgá-la à sua volta.
e era ele e eu
numa noite onde só a lua
pôde assistir e sorrir

.. eu nunca mais tinha visto um sorriso ..

e adormece ainda ela
até hoje, criança sua,
flor dos seus campos verdinhos,
no seu amoroso regaço
do sangue vertido e escarnecido
e o corpo seu em pedaços.

e quando ela cai
ele a levanta.
e quando ela chora,
pede a ele para
colocar-lhe no braço.
e o seu abraço e colo
é o único lugar
onde ela pode ser ela mesma
sem histórias apagadas.
com histórias construídas.
e sentir-se ainda tão amada.

o seu abraço e colo
é a sua mais perfeita
paz e morada.

Karla Melo

OST: "Madalene" - o Google não informa o nome do Artista

terça-feira, 21 de junho de 2016

Tempo


tic-tac
na insônia 
minha.
soleira 
da torneira
gasta 
e a impaciência
da pia
e a minha.
tic-tac
e os segundos:
antes.
agora.
depois.
já é.
já foi.
tic-tac
soleira 
gasta
das portas 
da vida.
e os segundos 
e a morte:
vida.
depois da vida:
Vida

... silêncio do tempo.

Karla Melo 

OST: Salvador Dali

sábado, 18 de junho de 2016

Passagem

Largo a mochila abarrotada de tralhas, e mortos e pesos e culpas e dores:
minhas e dos outros, mas que eu quero, estranhaMente, que sejam minhas e sobre os meus ombros, para que eu possa acariciá-las.
Mochila que eu mesma arrumo e desarrumo, todos os dias.

Paro. Abandono-a.
Esta não é a minha mochila favorita.
E nem tenho e nem quero estas "constâncias objectais".
E tiro ainda todas as roupas velhas de sobre o meu corpo.
Dispo-me. De conceitos antigos que eu mesma os construí.
No próximo passo já reside o melhor de mim.
Sigo metamorfopsiquicaMente.
Sigo ambulante da vida e guardo comigo a mão amiga.
Linda é a vida e eu não via!
Vês?! ... Sigo leve! Livre!
Feliz e grata pelo "agora" de cada passo dado na direção de todo o novo SER.
Complexa eu e com esquecimentos impossíveis. Mas remontados na felicidade do instante possível, só porque é.

Eu escolho a vida em movimento constante.
Eu escolho não ficar presa a nenhumas "paisagens".

Karla Melo

Imagem: arquivo pessoal

Fio da Flor-Amor


Palma das nossas mãos
Fechadas em concha
E cabem o grão
De tudo o que pode ser
Bom.

E juntos plantemos,
Então.
E florescerá
A cor do mais belo
Som.
O tom do mais belo
Arco
Por onde haveremos
De passar.

E da delicada textura
Da mais bela flor
Desfiaremos o fio.
E teceremos juntos
O pano das nossas noites
Estrelado.
O campo dos nossos dias
Com cheiro de flor
Que nos trará, carinhoso,
O vento que acalenta e embala
O nosso estranho
Amor...
Ao tocar em toda a alegria
De estarmos um.
E gratos e juntos.
E só.

Palma da minha mão
Fechada em concha e guarda
O fio da Flor - Amor
Que um dia me entregaste.

Karla Melo

Arte em Pastel: Vicente Romero

Equívoco


Eu não tenho qualquer vocação
Para nenhuns tipos de bajulação
E sinto asco se me bajulam.
Sou arredia, bicho do mato
E gosto pouco da humana comunicação.
É quase sempre truncada
Embaraçada e desinteressada
De nós.
E de uns pelos outros...
Por dentro de cada barulho.
Por dentro de cada silêncio.

Prefiro a contemplação
Da silenciosa Lua.

E gosto eu da ternura da flor,
Abraço sincero da dor
Da alegria ou do acaso
Muito mais do que dos desejos
Da efemeridade da carne.
Opto pelo abraço:
Do coração com o coração.

Sou uma maluca feliz
Que sabe dividir o pão.
Que aprende a servir um irmão.
Quase sempre atrapalhada
E que acredita na individual ação
Que soma-se à humanidade.
Mas que descarta a palavra em vão.
Aquelas...
Que não são ditas com o coração.

E se sentires algumas dores,
Posso eu não resolvê-las,
Meu irmão.
Mas posso eu te fazer descansar
Num abraço
Do meu cansado coração:
Coração com coração.

.. não costumo me explicar tanto assim ..

Karla Melo

Imagem: arquivo pessoal

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Ternura D'escrita


ó meu Pai
se foste tu quem puseste
esta sofreguidão em meu peito
então acato. oro por mim,
aquieto e calo.
espinho este que nunca tiras.
Grata sou, pequenino grão
fagulha da luz tua
que nunca compreenderá
este teu Amor desmerecido.
este teu Amor descabido e justificado
por mim.
esta tua filha sempre
descabelada-mente
confusa
e que tem mania de amores
e que tem mania de flores
e de querer aprender a servir
e abraçar todas as dores.

mas se ainda assim não foste
tu quem quiseste assim em mim:
esta ternura prima da dor
que chora por tudo e ri tola-mente
com todas as alegrias simples
mas que inquieta-me.
e expõe-me ao mundo
a minha alma de pecador, então
arranca-me de mim isto que eu sinto.
isto que eu não sei nem o nome
mas que, todas as noites, com desvelo
busco a ternura em meu peito
- com jeito -
e beijo-a e com tanto respeito
- grão brotado em flor -
no meu chão ressecado e cansado
e faço-a descansar na brisa leve
com medo que, um dia, ela esfrie
e se vá com o mundo
onde eu sempre tive dificuldade
em caber.

Eu sou uma descabida-mente.

mas é tão leve a ternura e imperceptível em segredo de olor
e vem perfumando os meus dias alegres em ti.
deito-a na palma da minha mão.
e é tão bela a contemplação.
pois se foste tu quem a puseste em mim
eu te prometo, silenciosa, atravessar-me
com o meu olhar, o teu Céu, a contemplar.
mas eu te confesso e ainda te peço:
não me permitas, em mim mesma, tropeçar.

ó meu Pai
se foste tu quem puseste
esta sofreguidão terna e agonizante
neste meu peito com mania de amores,
faz-me lembrar que eu sou tua.
e inspira-me do que queres de mim.
e ainda a ser grata por tudo:
por toda a paz e imutável Amor o teu
que lá na cruz tu me deste.

.. criança tua eu sou ..

Karla Melo

OST: Zolan

quinta-feira, 19 de maio de 2016

Prismas da Lucidez


anoitece e luto
hoje e amanhã.
quem sabe até
um pouco mais
com o meu luto
do prisma meu
engessado
em única face
tola.
hoje são prismas
facetados e lúcidos
e a sua amplitude
é o meu olhar do hoje.
e incômoda é a luz
nesta cegueira que adoece
e que mata-nos aos poucos
a erguer o vazio quase feliz
de outros loucos.

e a girar estou
em volta dos prismas
do que eu desconheço.
do que não era.
do que eu não fui.
do que eu necessito
- ser -
sem ser consequência
- de -

ó confortável angústia!
seja momentânea, mas faça-me girar
ainda mais! ainda mais!
para que possa eu vomitar
o ópio que há tanto saboreei
e engoli-o inteiro
sem nunca digeri-lo!

... cresci pseudo qualquer coisa útil
aos passantes
fragmentada-mente.
fecho os olhos meus então
e sinto medo e oro.
e choro o luto
daquela "uma"
insalubre e insana
que fomos nós.

miro-me ao espelho.
tomo um trago da verdade amarga
que nos rasga o véu
da alva e enganosa textura
- mentira -

... havemos de enterrar todos estes "mortos".
e ainda o prisma no olhar engessado meu e estúpido.
e girar... e girar... e girar...
até que alcance eu a lucidez numa valsa
no tom afinado da reconstrução do "eu"
e ainda apreciá-los todos...
e sentir paz.

Karla Melo - "Prismas da Lucidez"

Arte: David Walker - pinturas spray

quarta-feira, 11 de maio de 2016

Ser Humano em Caixas


Nada sabemos
Sobre nós mesmos.
Somos caixas fechadas
Em vergonhosos segredos
Em orgulhosos feitos
Que espalhamos pelo mundo
Aos quatro cantos do mundo
Para este imundo mundo
Nos bater muitas palmas.

Tudo sabemos
Sobre o outro
Quando miramos a caixa
De segredos de fora
Hermeticamente fechada
Nas dimensões estreitas
Do âmbito da visão
Tosca e habitual
Do imediato humano.

- o não suportar é um confronto com o medo das nossas supostas fraquezas -

Sinto saudades dos meus
Que conhecem o que mostro eu
Mas sabem ao menos falar
A minha flor, cor, perfume
Preferidos meus de outrora
Onde perdi-me e já nem sei
Por onde andei.

Cada ser é um universo único dentro de caixas
E dentro de outras tantas caixas.
Difícil é encontrar-se a si mesmo...
E quando encontramos...
Perder-se já não é mais lugar seguro.

 - hoje, sem querer, deparei-me com uma fotografia antiga -

Viver é um remontar contínuo e exaustivo do nada que sempre seremos
Mas cada um de nós tem a avaliação imediata do outro já concluída.

Que nota nós damos ao que miramos no primeiro instante?!
Prematuros somos às caladas do nosso olhar que agride em silêncio.

Karla Mello

OST: Michäel Borremans

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Sobre a Minha Rosa


rosa vermelha é  chegada.
rosa de amor e partida.
quando pousa sobre o bilhete:
veste alegria ou  despedida.
rosa vermelha chorona,
se orvalhada, está sentida.
rosa da lembrança que fica:
silenciosa lágrima incontida.

rosa prenúncio do abraço
que encanta,  faz e desfaz.
rosa da saudade laço
de amor sem querer ser nó,
do amor que nunca sufoca,
do amor que nunca escraviza,
do amor que segue um compasso.

rosa vermelha é chegada.
sobre o bilhete:
rosa amor ou despedida.

Karla Mello

Imagem Google

quarta-feira, 4 de maio de 2016

Toda a Palavra Ternura


olhar taciturno o teu
em lento espaço de tempo
- tempo, inexistente tempo -
quando pousa sobre o meu:

pouso da abelha rápida
sobre a flor que quer viver

e fazer brotar sementes
e adoçar o mundo inteiro
com a tua palavra alimento:
- mel aos  amargos todos -
que brota do teu desejo,
das mãos bondosas do céu.

eu comeria o teu olhar
para que o meu olhar, consigo
levasse, para sempre, comigo
o que eu posso apenas guardar.
eu posso guardar em chaves
codificadas por sonhos reais
tão meus e nunca serão teus
e nunca de ninguém mais.

olhar taciturno o teu
ternura tanta... guardo... guardo...
na constância do  tempo arenoso
e pequeno - curto é o tempo
onde eu apenas penso
ser meu.

Karla Melo

OST: Donald ZOLAN

segunda-feira, 2 de maio de 2016

Eternidade Finda


Dá-me o teu Amor
inteiro e desarrumado.
Não precisa um ponto e não importo-me
com as reticências.
A própria vida é reticente e nem sempre
posso eu completar as minhas frases.
Guardo-as para mim
Mas não fraciono Amores a entregar.
Entrego-os sempre inteiros
E gosto de sorrir e de sol.
De flores e também dos dias chuvosos.
Então, abraça-me...
Sê terno e amparo meu.
Dá-me o teu silêncio...
Esvaziemo-nos.
E dá-me a tua mão se a luz apaga.
E enxuga-me a alma quando sangrar.
Faz-me compressas lentas
E beija-me o instante
Como se fosse o último beijo
do até nunca fomos.
E ralha com o relógio e emudece-o.
Este tolo marca apenas poucos segundos
de vida nossa resfolegante.

Vil relógio das horas das paredes que aprisionam,
Haja que não sabe ele
que há eternidade nos segundos.

Dá-me, do teu Amor, por um segundo.

Karla Melo

OST: Alyssa Monks

(entre)pedras


pedra no dente
encravei o adorno.
as do sapato?
retirei todas:
em torno.
sob os pés.
sobre os pensamentos todos
e a cabeça.

cresci na chuva
e floresci.
... às vezes, não...
retorno às pedras.

... viver é uma inesgotável fome ambígua.

Karla Melo

OST: Rim Lee

sábado, 30 de abril de 2016

"de cara"


encarei os fatos.
juntei os cacos.
despindo os "fatos" - inclusive os de carnaval.
com a cara lavada
ao vento...
e livre.

sendo grata ao parto
deste novo eu
de mim mesma.
e aquecendo  o abraço.
alimentando o Amor
que É
o meu extrato.
limpando os pratos
da comilança insípida.
relembrando o grato.
esquecendo o ingrato.
com a cara lavada
ao vento...
e livre.

sanando o imediato.
desacatando qualquer mandato
que não seja o Amor de fato.
visitando o meu orfanato
... saudades dos meus irmãos...
e mantendo o olhar pacato.
e mantendo-me recolhida:
reflexivo celibato.
observando a vida
a renovar em mim
um novo contrato.
um trato.
um pacto
de Vida:
que eu seja Amor
com a cara lavada
ao vento...
e livre
de mim.

Karla Melo

OST: Helissandro Vieira Diniz

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Da Janela


Dividi com a chuva
a solidão da janela.
Foi quando vi
um horizonte ser colhido
na palma da minha mão.
Reverti em sol
a insensatez do meu olhar.
Foi quando avistei o eu - casulo
Enfim, borboletear.

E o que era a morte
Era a Vida.
Morta-Viva a borboleta:
pensando todas as suas cores
serem, sem pretensão,
espalhadoras de Amores
no seu pequenino mundo - vão.

... Pousou feliz numa flor em botão.

Karla Melo

OST: Márcio Camargo

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Da Janela, Flor Amarela


Miro as flores
Que dançam embaixo
Da minha janela
Bailarinas ao vento
Na cor amarela.

Miro flores
De mãos dadas embaixo
Da minha janela
Dias quentinhos
Gentil Primavera.

Miro flores
Da minha janela
Doces sonhos trago
No lado esquerdo
Da minha vívida
Lapela.

Bailarinas ao vento
Na cor amarela
Sopro de pólem
Move-se a Criação.
E a tudo observo
Em taciturno olhar
E a tudo sou grata.
… Da minha janela.

Karla Melo

OST: Margaridas - Google

domingo, 17 de abril de 2016

Canteiros Equivocados


Trouxemos flores
De canteiros equivocados
Resfolegantes, quase exterminados
Por ervas daninhas nossas
Em separados viveres.

Trouxemos flores
Agonizantes em sofreguidão
E insistimos juntos
Em uni-las e, pacientemente,
Regá-las como se possível fosse.

Como poderíamos, então,
Apreensivos e pesados
A carregarmos em separado
Potes de tantas mágoas,
Regarmos juntos e tolos
Flores equivocadas?

Destruamos, então,
O equivocado canteiro
De mortas flores vivas
De outora.
E olhemos nos olhos
Dos plantadores de flores
Vestidos de sonhos e cores.
E pranteemos juntos...
- por tudo -
O que haveremos de quebrar
Para, assim, renascer.
E ergamos as mãos
Pro alto em gratidão
Ao socorro que vem do Pai
Que faz de nós, míseros e imundos,
Brotar lindas sementes
De boa vontade,
Da possibilidade do amanhã,
Onde não haveremos mais
De prantear.

Recomecemos sem cessar
Com flores vivas e nossas
Num canteiro de Amor
Ainda mais belo, posto Verdade.
Sem as ervas daninhas nossas
Dos nosso equivocados canteiros,
Dos nossos separados viveres.

E será tanta a Vida!
E será bela a tão Viva Cor!
Todas em tons e aromas e
Sem sombras nem escuridão:
E será o tão nosso, enfim,
Vivo Canteiro de Amor.

Karla Melo

OST: René Magritte

sábado, 16 de abril de 2016

Sobre o "Hoje"


Hoje eu não quero falar do meu amor.
Das minhas renúncias. Nem das tuas.
Hoje renuncio. Não quero lavar a louça.
Não quero comer comida humana.
Prefiro a do cão.
Não quero beijar a tua boca.
Não quero sorrir. Nem chorar.
Não quero ouvir o barulho débil do relógio.
Nem a tua voz.
Nem a de ninguém.
Não quero ser mãe. Só filha.
Ainda suporto hoje.
Hoje não quero ser amante.
Quero falar sobre todas as verdades.
Quero gritar. Ser mal educada e egoísta
Com as minhas verdades.
Rasgar livros e esquecer de mim e de tudo o que li.
De tudo o que leio. Dos jornais.
Quero esquecer os bons modos e a paciência.
Quero transgredir. E beber. E fumar.
E dançar na minha loucura.
Quero voar da janela e enlouquecer.
Raspar a cabeça e vestir vermelho.
Hoje… Eu estou cansada.
E quero sentar diante do espelho…
Ofegante. E chorar.
O que eu quero mesmo?
Não consigo traduzir.
Hoje não.

Karla Melo

OST: Alyssa Monks

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Ser e Estar no Tempo


Ser é uma constância
Dos vários papéis
Necessários.
Temos que caber no mundo.
E esta é a minha grande dificuldade.
Eu voo nas asas do tempo.
E estar é ser
Feliz nas instâncias
Em que conseguimos parar
E nos determos ao que está.

O pensamento
Pode ser mordaça amistosa
Que afrouxa-se
Quando a pena está
Na mão
Da fala do inconsciente
Nem sempre de mãos dadas
Com o perdão
Mas que nos liberta
De nós mesmos.

Eu estou verdade
No meu inconsciente - pena na mão.

E quando eu partir
Nada me será mais.
E afora a vida,
O que terei a levar de volta
Senão o (ser)vir?!
Eis que a vida é
Um sopro sobrenatural.
Um fôlego.

Viver... é um doar-se sem fim.

Karla Melo

Carvão: Charcoal Drawings by Daisy



Silencia


Conheço muito pouco de mim quando estou feliz.
Conheço muito de mim se mergulho em teu egoísmo.
No teu sádico grito. No teu cinismo.
Queria ser muda e até fico.
Deixa-me.
Mas queria ser silêncio absoluto.
O silêncio também grita.
O silêncio é açoite.
O silêncio veste branco e é calmaria.
O silêncio veste noite e é solidão.
O silêncio veste cores.
Muitas cores quando é opção.

Conheço muito pouco de ti quando estás feliz.
Conheço muito de ti se mergulho em meu egoísmo.
E como te mostras…
Basta que mergulhe eu em mim.
Na minha existência unicamente minha.
Onde não te cabe.
Onde não me cabe.
Eu não caibo no mundo.
Nem no teu,
Nem no meu.
Tu cabes
No meu e é sempre assim.
Transitas. Te arrumas.
Falas e silencias.
Ditas. Mas é até onde eu permiti-lo.
Não. Hoje eu não caibo no mundo.
Não no teu.
Resolvi que também não cabes no meu.
Só caibo no silêncio que açoita-me hoje.
E tu em nenhum lugar de mim.
Quero brindar a isto!
Embreagar-me do gosto dos beijos de outrora.

Silencia por favor.
Deixa-me mergulhar em mim mesma.
Deixa-me na minha ausência de paz.
Deixa-me na minha costumeira inquietude.
Ela é confortável e já estou habituada
E é aonde sou, choro e oro.
Vá sorrir e cantar e dançar…
Vá enlouquecer em paz!
Procura um mundo… Vá!
Contemplo-o de longe no teu carnaval fora da época.
Fantasia bonita a tua, mas poderias trocá-la de quando em vez.
É tão cansativo… Mas posso assistí-lo passar.
Depois disso...
Deixa-me silenciar o meu silêncio.
Deixa-me no meu mundo em qualquer forma de silêncio.

Conheço muito de mim enquanto passas.
Conheço muito de ti enquanto fingimos
Que tudo passa.

Karla Melo

OST: Alyssia Monks

Saudade Riachinho

Dia de sol...
Sol bem mansinho
E gotas de orvalho
Molham rostinhos.
Crianças que passam
Na minha janela
Correm e pulam
Agasalhadinhas.
Vem, orvalhinho
Sejas tu ligeirinho
Traz-me notícias
Do meu pequeno ninho.
Ajuda-me aqui,
Sábio passarinho!
Puxa este fio
E tricoteia comigo
E com a tua bondade
Põe na bolsinha
Água e descanso
E tricô da saudade.
Atravessa o Atlântico
Mas sejas prudente!
E ensaies um cântico
De soprar cochichinhos
De saudades de mãe,
De saudade de vó,
Gentil passarinho,
Aos meus amores
Meus menininhos.
Mas sopras mansinho
Sem fazer alarde.
A minha saudade
É tal riachinho:
Molha e escorre
Em silencioso caminho.
Obrigada, gentil passarinho.

Karla Melo

OST: Théodore Gérard

quarta-feira, 13 de abril de 2016

Pé de Carambola e Sonhos Bons


O vento sopra a areia do tempo
Visto as vestes do tempo e não sinto mais o mesmo vigor
Na minha cama… Na minha pele… Nas minhas mãos.
Queria mesmo era esquecer.

Canta, tempo e leva-me para longe.
Leva-me para a casa da minha infância
Onde o desassossego era adulto e não era meu.
Eu só estava por perto e espectadora quase dispersa.
Eu acreditava ser tão simples resolver o que eu via.
Não. Eu cresci e não era simples.
Nem sempre larguei os meus afazeres de sonhos bons para olhar o cenário real.
Se eu pudesse, brincava o tempo inteiro de cabra-cega.
Aliás, era a minha brincadeira preferida.
Gostava também de brincar de esconde-esconde e sumir um pouco.
E subir no pé de carambolas do quintal do vizinho
E posso dizer-lhes, meus senhores…
Que lá no “olho” da árvore… O vento tinha tempo
De balançar-me a alma e pentear-me os cabelos meninos
Não gostava muito de largar a minha caixa de lápis coloridos e cheirosos:
cheiro de cera e de infância, que deveria ser permanente.

E quando chovia… Preocupações também adultas.
E era o dia mais feliz para mim!
Bonequinhos desciam as correntezas que formavam-se no meu quintal,
Nos meus barquinhos de papel que desmanchavam-se...
Tão rapidamente quanto os sonhos bons.
Sempre fui sozinha… Mas não de gente.
Esta forma melancólica que é envólucro amassado de minha alma
Anda comigo e desde sempre. Mas nem sempre gosto.
Bem… Também não gostava de ser meio ruiva. Isto eu pude mudar.
Não de ser ruiva. Mas do “meio-ruiva”… Não gosto de nada pela metade.
Lembro-me que fitava o espelho da penteadeira de minha mãe
- foi um presente de meu avô marceneiro -
Ele sabia fazer mágica de aparecer móveis na minha casa pequena.
Minha mãe ficava rapidamente feliz.
Então… Quando eu fitava o espelho dela por um bom tempo…
Pensava em gravar o meu rostinho na minha memória.
Sonhava em ser bonita como ela… Tolice de criança.
Mas eu não queria a vida dela para mim.
Em contraponto, queria existir igual à ela: plena. Corajosa. Linda.
Ela fazia tudo ao mesmo tempo e não esquecia o batom carmim.
Nem o sorriso… Nem a gentileza. Nem de acompanhar as notícias.
E sabem… Nunca amargou. Permaneceu a ternura.
Lamento, mãe. Eu não consegui ser igualzinha a ti...
Não suporto tudo.
E sou ponto… Sem nunca ser o final.
Reticente...
Mas consigo sorrir em dias de chuva
Quando lembro-me dos barquinhos da minha infância.
Dos badoques construídos astuciosamente pelas mãozinhas trelosas dos meus irmãos.
E eu sei chorar junto aos meus irmãos dores nossas.
E eu os amo… Muito e tanto e sempre. E para sempre os guardo
Na minha caixinha de lápis cheirosos e sonhos bons.
E não necessito do Amor para Amar…
Simplesmente amo a quem eu amo. E pronto.

Eu nunca tive muitas bonecas…
Mas aos oito eu ganhei uma boneca linda demais…
De verdade e com olhos de sonhos.
E adulta, ganhei outra… Olhos de sonhos também.
Todas as minhas bonecas têm olhos de sonhos. Não sei por quê.
Mas eu tenho apenas sonhos bons quando olho nos olhos delas:
minhas duas bonecas de sonhos bons.

Hoje eu amanheci cansada e vestida com a roupa do tempo.
E o vento do pé de carambolas não penteia mais os meus cabelos.
Ele embaraça as minhas idéias e levanta a areia do tempo
… E da saudade e sinto medo.
Preciso voltar à casa “sacra” da minha infância.
Vou tirar esta roupa… Tomar um banho e esfregar-me bastante
Lavar o tempo hoje de mim.

Karla Melo

OST: Renoir

Segredos de Espelho


Espelho que já ocupavas o teu canto quando te encontrei e o meu eu.
Juntamente com o tempo teu e de todos os que param para mirar-te.
Quantas faces olharam-te de frente a questionar
- como num solicitar de explicações acerca do que viam -
Do que não acompanharam ou sequer perceberam?!
Penso na tua aflição ao explicar em tua voz muda:
“O tempo… O tempo…”

Compadeço-me de ti, espelho…
Quantos não te chegaram a cochichar segredos
- te mantenhas em silêncio, eu te suplico…
Sou apenas mais uma a contar-te segredos.
Segredos contados entre choros e risos
E cinismos até sensuais
E contracenamos apenas eu e tu neste momento.
E são tantas caras e tantas bocas e tantos gemidos de dores e amores.
Roubas minh'alma lentamente e morro cada dia um pouco...
E me dizes do tempo.
Então que cumpras a tua sina!
Fotografa-me em tua memória e zombas de mim!
Percebes escorrer-me inteira e estou certa que sim!

Silencio eu...

A cada dia que recorro a ti, mais uma fenda… E segredos.
Fendas na face. Fendas da alma.Fendas na boca…
Que não consegue desdizer sobre o que deixou-se de dizer.
Fendas nos olhos… Venda-me!
Não quero ver – Fendas!
São mesmo minhas ou apenas a tua maldade
Do que desejas mostrar-me?!
Impiedoso e verdadeiro espelho…
Pontas dos dedos meus em tua face e és frio.
Não desdenhas de mim e deixa-me aqui…
Quieta e a fitar a apenas à mim e a ti.
E, sobretudo, sobre tudo.

Deixa-me em paz.
Deixa-me pensar e escolher entre rir e chorar.
Escolher o que te apresentar de mim hoje.
Espelho do canto de meu quarto…
Espelho do canto de minh’alma.

Karla Melo

OST: Alicia Suarez